quinta-feira, 26 de março de 2009

Desabafo de um Enfermeiro:

ERA UMA BOA CARTA PARA FAZER CHEGAR À MINISTRA DA SAÚDE



Desabafo de um Enfermeiro:


Como Enfermeiro, estive hoje de greve assegurando cuidados mínimos.
Revejo-me integralmente nas reivindicações da classe. Mas pergunto-me como as outras pessoas vêm a nossa classe, a nossa profissão, a nossa posição na sociedade. Será que não seremos o parente pobre de um sistema de saúde que só tem olhos para outros interesses…

Sou licenciado. Ganho como bacharel ou nem isso. Deveria fazer 140h por mês e trabalho 160 ou mais. Não recebo nada por essas horas a mais, acumulando horas. Tenho colegas com quase 200h positivas, ou seja, 200 horas que prestaram serviço de qualidade e que não viram compensado o esforço, e porque não dizê-lo, dedicação à causa pública, fazendo os possíveis todos os dias para não faltar nada em termos de cuidados de enfermagem. Essas 200 horas deveriam ser pagas como extraordinárias, ou melhor ainda, deveriam ser realizadas por um dos 5mil enfermeiros que actualmente não tem emprego. No meu serviço devem-se mais de 2000h. No meu hospital há umas dezenas de serviços e a média é nalguns casos superior. Devem-se no país, talvez um milhão de horas de cuidados. O que daria trabalho a mais 7000 Enfermeiros. E já nem estou a falar no aumento do número de enfermeiros por cada turno, senão o número teria de ser ainda maior. No meu serviço, para 32 doentes, podem estar apenas 2 enfermeiros de serviço. E ao contrário do que por vezes pensamos (os enfermeiros pensam) só temos 2 mãos, 2 olhos, 2 pernas e 1 cabeça. E não somos omnipresentes.

Sou contratado há mais de 4 anos, trabalhando um pouco à margem da lei com contratos de 6 meses 'miraculosamente' renovados. Mas será que algum dia deixarão de precisar realmente dos enfermeiros para termos um contrato tipo 'hipermercado' ou pior? Depois, nestes 4 anos vi o meu ordenado ser aumentado pouco mais de 40€, ou seja 10€ ano. Não subi nenhum escalão, grau, etc., porque simplesmente não há carreira de enfermagem definida, e como contratado a coisa complica-se. Qual é o meu estímulo todos os dias? Apesar de ainda adorar o que faço, trabalho porque preciso do €€€€.
É frustrante pensar que todos os anos ao contrário do que deveria ser, ganharei menos.
Deveria ganhar como licenciado e ganhar horas extras se me fossem exigidas.
Eu que ganho 6,5€ à hora, bem menos que alguns funcionários da limpeza (sem desprimor para o seu trabalho), não me pagam horas extra.

Mas pagar 2500€ por 24h de um médico, já é moralmente e legalmente aceite.
Deixemos de ser hipócritas. Sou mal pago.
Sinto todos os dias na pele, o peso e o risco desta profissão, que não é dar injecções e medir tensões.
Está redondamente enganado quem dessa forma pensa. Somos um elo central nas relações clínicas, uma peça chave. Quem esteve internado e já precisou de nós saberá a tudo o que me refiro.

Formação adicional é sempre condicionada pelos serviços e instituições, num país que quer ter miúdos com computadores por todo o lado, num país em que se não formos doutores não somos ninguém, mas apelar a uma formação contínua, tendencialmente gratuita, é só para outras classes.
A qualidade afinal é para outros verem. O doente que se trame. Se tenho um curso de suporte básico de vida, devo-o a mim. 200€ e tem de ser renovado em 2-3 anos.
Se tenho um curso de suporte avançado de vida, devo-o a mim. 400€ e renovado em 2-3 anos.
Se quero ser especialista, terei de ter pelo menos mais 6000€ de propinas para pagar.
E depois, esperar que me aceitem numa instituição, que abram concursos, que se desbloqueiem verbas, etc.
Um médico depois de médico torna-se especialista praticamente sem ir à escola em 6 anos. A prática é quase tudo.
Nós seremos muito diferentes? Se quero tirar uma pós-graduação ou mestrado, arrisco-me a queimar as pestanas e tirar tempo à família, não esquecendo mais 3000€ ou 6000€ de propinas. Em troca recebo mais 0€ ao fim do mês.

É isto um estímulo ao desenvolvimento? É assim que a profissão está. É assim que nos sentimos.

E vós que opinião tendes dos Enfermeiros?

Recebi este email e subscrevo-o inteiramente!

É esta a realidade do nosso país e da Enfermagem! É pura, nua e crua!!!
Necessita-se de saúde para a Saúde ! !

De: um enfermeiro anónimo.

Esta carta foi-me enviada pelo Bruno, obrigada.

2 comentários:

Skywalker disse...

O ebfermeiro é capaz de ter razão, mas...
não sei porque recebo noticias de que em muitos hospitais e centros de saude em portugal estão a trabalhar enfermeiros e médicos que vão para Portugal , presumo eu que pr falta de enfermeiros no país.
lendo este post, sou obrigado a pensar que provavelmente a maioria dos enfermeiros desempregados só quer trabalhar nos grandes centros ( Lisboa, Porto, Coimbra), o que nãoabona nada a favor duma classe que reclama ser essencial ao bom funcionamento da saúde pública.
Quantoao facto de ser necessáio uma licenciatura para exercer, acrescida de formação continua suportada pelos profissionais, o mesmo acontece noutras áreas em que os vinculos são igualmente precários.
Não deve servir de consolação, masum caixa de banco ganha menos e tb é licenciado.
Mais... Alguns trabalhadoresde hipermercado são licenciados e trabalhamem condições piores que um enfermeiro, escolheram foi cursos que nãolhes dão acesso à protecção quecontinuam a ter (indevidamente) os quetrabalham para o Estado.
Peço desculpa se o comentário é duro, mas faz-me confusão as pessoas queixarem-se de barriga cheia e pensarem que que o seu desenvolvimento pessoal e profissional deve patrocionado pelo dinheiro dos outros.

Beijokas

Kito disse...

Após ler este post fiquei com uma ideia totalmente diferente do que conhecia da vossa profissão.

Tenho noção que fazem demasiadas horas, o que pode por em risco o atendimento aos utentes (sim, este assunto está mais que debatido); o que não tinha noção era os gastos que têem para renovar constantemente os cursos.

Quanto aos gastos em formação, são normais em todas as profissões. Sendo que neste país as propinas são normalmente "iguais" para todos os cursos, dependendo de estabelecimento de ensino, embora eu ache que não deveria ser bem assim.. A formação extra é bastante cara, dependendo normalmente do nome do estabelecimento que fornece o diploma.

Força com isso! Estar a fazer uma coisa de que se gosta é meio salário pago :)

Cumprimentos,

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